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sexta-feira, 5 de dezembro de 2014

A COMÉDIA É UM GÊNERO CONSOLIDADO NO BRASIL

Por Joilma Maria de Freitas Trindade*


A comédia é o gênero com o qual o brasileiro se identifica mais. Mas, afinal, como a comédia se estabeleceu entre nós? Os Jesuítas (membro ou instituição Companhia de Jesus), com a intenção de catequizar os índios com a religião católica, trouxeram também uma cultura diferente: a literatura e o teatro. Dois séculos transcorreram entre as atividades Jesuíticas e o desenvolvimento do teatro no Brasil. Durante esse período (séculos XVII e XVIII), o país, que estava em fase de colonização, lutava pela autonomia do território colonial. Toda essa agitação refletiu no Teatro, que, apesar do sentimento nacionalista, tinha uma literatura dramática inaugural que dependia de iniciativas isoladas. Assim, a partir da Independência do Brasil, em 1822, na fase do romantismo, que rompeu com a tradição clássica, instalou-se um teatro determinado e engajado. Inicia-se a passagem a um teatro nacional.

Em 1833, o ator João Caetano formou uma companhia brasileira. A história da dramaturgia nacional está diretamente ligada ao ator por dois episódios marcantes: a estreia, em março de 1838, da peça Antonio José ou O Poeta e a Inquisição, de autoria de Gonçalves Magalhães, no Teatro Constitucional Fluminense. É a primeira e única tragédia escrita por um brasileiro que tratava de assunto nacional. Foi o primeiro passo para implantação de um teatro considerado brasileiro. Outras contribuições importantes figuraram nesse cenário: a de Arthur Azevedo, Gonçalves Magalhães, o escritor Machado de Assis e José Alencar. Além desses, ressalta-se a participação pioneira de Martins Pena, com suas comédias de costumes.

Ao longo do processo histórico-social brasileiro, as manifestações artísticas e culturais tiveram um papel singular na consolidação da identidade nacional. No teatro, por exemplo, fixaram-se como uma nova leitura do que fora feito até então. Assim, em outubro de 1838, foi apresentada pela primeira vez a comédia O Juiz de Paz na Roça, de Martins Pena, no mesmo teatro do começo de João Caetano. A peça foi o primórdio para a afirmação da comédia de costumes como o gênero preferido do público. As peças, por estarem incorporadas ao Romantismo, eram bem aceitas pelo povo, cansado do formalismo anterior, isto é, do teatro proveniente da Europa, que tinha como principal objetivo satisfazer a classe dominante brasileira, que transformava as exibições em autênticos acontecimentos sociais.

A perceptível identificação do Brasil com esse tipo de teatro deu-se pelo fato de o autor tratar de aspectos da vida social, destacar temas que envolvem as tradições e costumes populares: como as festas do Espírito Santo, festas da roça, a “malhação” do Judas, as festas de São João, as intrigas domésticas, os caçadores de dotes, os casamentos por interesse e os contrastes e diferenças entre o universo rural e o da cidade. Os personagens criados por Martins Pena descrevem com fidelidade o Brasil da época: funcionários públicos, meirinhos, juízes, malandros, matutos, estrangeiros, falsos eruditos, profissionais da intriga social.

A comédia de costumes, ou seja, a encenação que por meio do humor e da sátira procura revelar os costumes e condutas da sociedade, revelando a desorganização, a corrupção, a exploração, os comerciantes fraudadores, os interesses pessoais em detrimento dos coletivos, é que denuncia os desvios de caráter e os vícios que estão camuflados na personalidade humana.

O nosso herói cômico vem da plebe do campo. Faz o povo rir de si mesmo. Demonstra compreensão, superando suas dificuldades com festas, piadas e brincadeiras. Embora faça as pessoas rirem, a função da comédia não se limita só a isso, mas, particularmente, à superação de algo. Não há elevação de status, este permanece o mesmo. O homem do campo representa nossa identidade. Por causa de nossa vocação, o nosso teatro desenvolveu mais a veia cômica do que a dramática.

No estrado do teatro de comédia, procurávamos nos achar, nos entender. Não havia uma crítica expressa, visto que a consciência do povo estava começando a se formar. Aos poucos, a peça cômica começa a ganhar um tom de denúncia, provoca reflexão, suscita o questionamento e através do humor irônico, denuncia uma falta na sociedade, isto é, cutuca as relações de poder com ironia, sai em defesa das questões coletivas. Desenvolvemos, então, a característica cômica para buscarmos nossa identidade.

O cômico revela nosso ideal como povo. Quando representamos, deixamos de ser colonizados para sermos outras pessoas. O desejo se materializa por meio das atuações. Cria-se, no palco, a sociedade com a identificação que se quer afirmar. No tablado, o homem comum protagoniza as mudanças que gostaria de ver transformadas em ações concretas. Ali se realiza como cidadão que tem uma carteira de identidade.

Enfim, sabemos que, embora universais, ou seja, marcados por várias culturas, ainda somos subjugados ao “ranço” da colonização portuguesa. Portugal “despiu” o índio de sua cultural original, imprimindo-lhe a sua e tornou-se nosso principal colonizador. A nossa afinidade com a comédia se dá por conta da luta para comprovar nossa identidade como povo, como nação, que quer e deseja ser reconhecida pelo que é, e não pelo que foi. Continuamos a jornada. Somos um povo indefinido. Hoje, nossa formação provém de diversas etnias. Isto posto, quem nos garante que falamos português ou que a cultura que nos caracteriza é a do nosso colonizador?

Viva a comédia, que permite que sejamos outros em nós mesmos, em busca de nossa própria marca!


* Joilma Maria de Freitas Trindade é graduanda do 5º semestre do curso de Letras Vernáculas da UEFS.

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